O que aprendi no marketing político e levo para o dia a dia nas empresas

Nos últimos 20 anos, trabalhei com estratégia e criação para os maiores clientes públicos do RS e grandes marcas regionais e nacionais dos mais variados segmentos. Também atuei com marketing político, realizando diversas campanhas majoritárias e proporcionais em 4 estados do Brasil. Depois de tanto tempo nestes dois mundos, fica claro que o marketing na política é muito diferente do trabalho para a iniciativa privada.
No entanto, aprendi algumas lições que trago diariamente para meu trabalho junto a empresas.

Mistura de Novela e Reality Show

Comecei a fazer campanha política em 98, uma pequena campanha de deputado. Minha primeira campanha para Governador foi em 2006. Nesta época, o Facebook estava engatinhando (só foi aberto ao público em setembro de 2006) e a maioria das grandes empresas que estão ressignificando mercados hoje em dia, sequer existiam.

De qualquer forma, seja nas campanhas do passado ou nas contemporâneas, as plataformas mudam, mas a essência não. Campanha política é mistura de novela e reality show.

Existe o lado da história que você domina e entrega por meio de suas peças, programas e discursos, mas existem questões fora de controle. Sejam adversários, eleitores, imprensa, declarações do próprio candidato, de apoiadores, que seja um tweet, uma foto, enfim, é uma lista infindável. Dominar todas essas variáveis é impossível.

Mais importante é compreender seu eixo, sua linha de discurso e surfar as variáveis entendendo que eventuais danos e crises são inevitáveis. Vai acontecer com você. Vai acontecer com seu adversário. A diferença é como cada parte vai lidar com isso, gerenciando a situação de maneira adequada o mais rápido possível.

Comunicação Permanente

Notícias, contrainformação, ocupação de espaço na imprensa e na atenção das pessoas. Na política e no ambiente privado, o trabalho de comunicação nunca termina.

Campanha política começa muito antes do período eleitoral, eu diria que até mesmo antes da pré-campanha.

Na verdade, um político experiente sabe que está sempre em campanha, estando no poder ou não. O importante é ocupar espaço na mídia, provocar discussões, marcar posição, unir pessoas em torno de um sentimento, de uma ideia. Campanha política nunca sai do ar. É uma guerra de percepções. O caráter permanente da comunicação invadiu nossas vidas de maneira assustadora, principalmente depois da internet e todas as possibilidades de conexão e segmentação.

Hoje, as marcas dão o tom da comunicação, reforçam seu posicionamento por meio de suas manifestações oficiais em caráter permanente: publicidade, redes sociais, eventos, ponto-de-venda, imprensa e até memes como estratégia política.

Mas o volume de conteúdo gerado é muito maior. Se a narrativa é viva, como pontuei no tópico anterior, a maneira de contar histórias vai muito além do que a marca pode controlar.

De qualquer maneira, perceber esse cenário e administrar a narrativa da marca como se fosse um roteiro escrito em tempo real é a melhor maneira de manter a conversa interessante através do marketing político. Não dá pra depender apenas do pacote padrão de comunicação. Para ter comunicação permanente, é preciso fomentar e gerenciar um ecossistema ao redor da marca.

Pessoas e Motivações

Campanha política é uma reunião de pessoas em torno de uma ideia, de um objetivo, de um sonho. É realmente muita gente envolvida. Muitas histórias. Muitos interesses. Aliados, assessores, cabos eleitorais, simpatizantes, equipe de comunicação. É uma lista infindável. É difícil manter tanta gente alinhada ainda mais num período tão tenso, em que os ânimos se acirram e os interesses colidem.

Nesses momentos, entender as motivações das pessoas e os pontos de convergência é fundamental. Aqui vale uma observação: Prefiro o termo motivação ao invés de propósito, por acreditar que este último seja um pouco romântico voltado a satisfazer o ego do dono.

É bonito falarmos para um empreendedor que iremos unir pessoas em torno de seu sonho, que ele será o líder de uma transformação que irá impactar vidas e transformar o mundo. Esse tom messiânico domina de hackathons a reuniões de conselho. Mas essa bolha de propósito é uma construção sutil e tem a tendência de estourar.

Por isso, prefiro ser mais pragmático e falar de motivações.

O Brasil é uma escola. Esteja disposto a aprender!

Entender as características culturais locais e ser humilde para aprender é premissa básica para quem trabalha com comunicação.

Sou gaúcho. Em 2008, fiz uma campanha em Porto Alegre com uma equipe maravilhosa. Profissionais de São Paulo, Rio, Minas, Argentina, Austrália. Eu era o único gaúcho da equipe de criação. Um dos meus papéis era ajudar os profissionais a entender melhor a cultura gaúcha, a cidade e o porto-alegrense.

Num dos tantos pré-testes de material, eu havia criado um comercial que o coordenador da campanha não acreditava muito, mas igual mandou testar porque entendia que minha missão era essa mesma: provocar e fazer coisas que talvez eles não fizessem. Lá foi o comercial – junto com alguns outros – para a pesquisa qualitativa. O resultado foi que a peça que eu havia criado foi uma das preferidas na pesquisa. O coordenador, um profissional extremamente experiente  e sensato – deu uma lição aquele dia que nunca me esqueci.

Não importa o quanto você sabe, o quanto viveu, o quanto venceu. Seja humilde e aprenda.

Dois anos depois, eu vivia essa mesma experiência. Só que do outro lado. Em 2010, fiz minha primeira campanha fora do RS. Segundo turno da eleição de governador de Rondônia. De lá pra cá, também trabalhei em São Paulo e no Amazonas. Se existe uma sensação de sair da zona de conforto é ser catapultado do seu estado, da sua cultura e do dia pra noite ter que conectar novos pontos que nunca haviam se encontrado.

Para realizar uma campanha política é preciso um profundo conhecimento do contexto político, econômico, cultural e social. É impossível mergulhar nisso em poucos dias – por maior que seja o esforço. Nessas horas, é fundamental ser humilde. Ouvir mais, falar menos.  Conversar com as pessoas que vivem lá há muito tempo. Respeitar sua história e sua opinião.

Em tempos digitais, colocar a barriga no balcão nunca foi tão importante.

Cuide bem de quem gosta de você ou ao menos está com você há bastante tempo

Existe um ditado na política que diz que os piores inimigos são os que antes estavam mais próximos. A frustração e a sensação de traição são avassaladoras.

Destroem relacionamentos e reputações. Na busca por escala e ampliação de base, um dos maiores erros do marketing político e de vários outros setores que percebo é o descuido com a base de clientes. Para clientes novos, a sedução de promoções e benefícios.

Para clientes antigos, a rotina do descaso. Clientes fiéis e satisfeitos não aumentam apenas o NPS.

Compram mais, indicam mais, criam um ambiente positivo até mesmo para o público interno. Confiança e apreço são ativo valiosos e delicados.

Cuide bem deles.

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