Em fevereiro deste ano, estive na América do Norte visitando grandes redes e marcas dos EUA, vivenciando a experiência de alguns exemplos cases de disrupção que trago no meu livro “Desaprenda – como se abrir para o novo pode nos levar mais longe”, os quais tenho levado em palestras no Brasil e outros países.
Trabalho com criação de estratégias de negócio e participação em Governança Corporativa, e procuro frequentemente realizar algumas imersões em outros países para conhecer exemplos de como mercados distintos estão aplicando a inovação na prática, em seu dia-a-dia.
Nessa última viagem, reuni muitos insights sobre intra-empreendedorismo e inovação, as quais narrei em meu Instagram e, a convite do AAA Inovação, trouxe para você mais alguns detalhes exclusivos sobre essas grandes marcas dos EUA.
O que grandes redes e marcas dos EUA fizeram de diferente?
Existe uma característica muito interessante no mercado americano, com a qual podemos aprender, que é a construção de uma cultura de abertura para o novo, através da experimentação.
Tanto marcas quanto consumidores estão dispostos a experimentar, e isso faz uma diferença importante no processo de inovação e de renovação. As maiores empresas do mundo tiram ideias do papel e testam, mesmo em formato Beta e consumidores dão feedback que facilitam a sintonia da operação. Isso inspira a fazer diferente, entregando ao consumidor uma experiência fora do comum, e criando essas histórias que trago aqui:
- Uma rede de cafés passa a vender conceito de lugar preferido (depois da casa)
- Uma empresa com venda on-line passa a usar o varejo físico para crescer
- Uma rede de varejo devolve um produto que nunca vendeu
- O proprietário de uma rede de fast-food gasta o dinheiro da faculdade dos filhos
- Uma mãe divorciada vende saladas de porta em porta
- Um jovem empreendedor bebe detergente líquido diante das câmeras
Abaixo, entenda o que cada uma das grandes redes e marcas dos EUA que visitei pode ensinar para empreendedores brasileiros:
Whole Foods Market
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Um dos grandes diferenciais que observei na Whole Foods Market foi a maneira que eles encontraram para conciliar visões de empreendedor, Conselho de Administração e grupos de consumidores para vender, simultaneamente, produtos orgânicos e a base de carne. A venda de carne é muito supervisionada e está dentro de padrões aprovados pela Global Animal Partership (GAP).
Também vendem carne à base de plantas, o que tem crescido muito no mundo, com a Beyond Meat tendo tido uma valorização extrema nas bolsas, ao mesmo tempo em que, em Israel, já se produz carne clonada de animais.
No Brasil, a Futuro Burger, de Jaraguá do Sul, já está presente em supermercados ao redor do Brasil, com uma nova proposta para o consumo de carne. Não é à toa que a Whole Foods Market foi comprada pela Amazon por US$ 14 bilhões.
Starbucks
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Costumo visitar e consumir em muitas Starbucks, mas o que me chamou a atenção neste momento foi o quanto as pessoas parecem felizes em servir um café a você.
Howard Schultz, eterno CEO da empresa e responsável por tê-la feito crescer, é responsável por isso: dando benefícios incríveis e fora do comum aos colaboradores (o pai dele era um motorista de entregas que se acidentou nos anos 1960 e não recebeu assistência alguma da empresa onde trabalhava), ele constrói uma cultura de acolhimento de dentro para fora, o que faz com que cada consumidor da Starbucks seja recebido de um jeito especial.
Vejo no Brasil muitas cafeterias tentando copiar o modelo da Starbucks, colocando o “nome no copo”, mas ainda sem saber criar esta atmosfera que grandes redes e marcas dos EUA são capazes de criar.
Existe oportunidade para isso. Essa construção de cultura tão sedimentada foi o que fez com que a entrada da Starbucks no Japão, em uma época em que ainda não existia internet e redes sociais, tenha sido um sucesso: quando a marca atravessou o Pacífico, o consumidor japonês já estava lá esperando por ela — mesmo com as dúvidas do CEO Howard Schultz, conforme eu conto no vídeo acima.
Lululemon
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Chama muito a atenção na Lululemon, marca que praticamente criou o segmento de Athleisure nos Estados Unidos, o quanto a empresa prioriza uma sinergia entre “function” e “fashion”: mesmo tendo percebido uma oportunidade em criar moda em um segmento onde as pessoas vestiam sua pior roupa para ir à academia, moda por si só nunca foi o único foco.
Era preciso uma roupa que também permitisse a alta performance. E que, com a capacidade do consumidor americano em experimentar e pagar pela inovação, acabou levando a moda das academias (começou com Yoga) para as ruas, inspirando marcas como Nike e Adidas.
No Brasil, um bom exemplo de quem está sabendo unir função e moda é o da Track & Field, com produtos de qualidade e preço premium, e que já possui mais de 100 franquias no país, e inclusive lojas nos Estados Unidos.
Warby Parker
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Quando você entra em uma loja física da Warby Parker, além de experienciar uma atmosfera de loja fora do comum, você é surpreendido com uma característica sensacional: todos os óculos vendidos são unissex. Provei vários, comprei um de presente para minha esposa e, admito: fico com vontade de usar.
Iniciando no digital, a Warby Parker rompeu o padrão da compra de óculos e agora está utilizando o varejo físico como ampliação da experiência. Com design de ponta e preços justos, um exemplo claro de como digital e físico podem se complementar, não importando onde a marca começou, e que pode ensinar muito ao varejo que busca ser omnichannel no Brasil.
Chicken Salad Chick
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A Chicken Salad Chick é um exemplo de como a soma de vocação e necessidade pode ser determinante no empreendedorismo. E de como o ambiente de loja pode ser capaz de transmitir, através dos diversos elementos, essa essência: a Chicken Salad Chick tem cor, aroma e aconchego de “pasta de galinha”, vendendo a melhor pasta de galinha que você já provou na vida. A fundadora, Stacy Brown, era uma mãe de três filhos abandonada pelo marido que começou a vender salada de galinha para as vizinhas para sustentar a família. E deu os nomes das vizinhas às próprias saladas.
Com o consumidor apoiando a causa, montou o primeiro restaurante, e os homens, no início resistentes a comprar saladas com nomes de mulheres, se arriscaram a experimentar e passaram eles mesmos a querer cada vez mais as saladas. Me lembrou a história de tantos empreendedores brasileiros que começaram negócios vendendo comida de porta em porta, como Rick Chester, o ambulante que vendia água mineral em Copacabana e foi convidado para palestrar na Harvard University.
Dentro do banheiro masculino da Chicken Salad Chick, você encontra uma placa que diz: “Não há razão para magoar os sentimentos de ninguém: ficaremos felizes em continuar fingindo que a salada de galinha de sua mãe é a melhor que existe”.
Nordstrom
Essa história que eu conto no vídeo é fantástica, e nem todo mundo conhece.
Quando o dono da Nordstrom devolve o dinheiro de um produto que nunca vendeu, cria um verdadeiro propósito de marca, e uma cultura de atendimento ao cliente. Supomos que uma experiência de compra ideal não pode se dar ao custo de prejuízo excessivo para a marca, quebra de processo (como dar baixa em uma peça que não está em estoque?) ou incapacidade de escalar para todo o negócio.
Mas em tempos de migração do PDV (Ponto de Venda) para o virtual, às vezes parece que ainda falta ao varejo físico a compreensão de que é justamente no espírito de atitudes isoladas como essa que poderá estar o futuro de uma experiência mais pessoal e próxima.
O varejo brasileiro pode aprender muito com essa filosofia, e já vejo no exemplo de marcas como Magalu uma capacidade de entrega, velocidade, pontualidade e atendimento ao cliente.
Five Below
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A Five Below é uma experiência característica do varejo americano. Um modelo promocional bem definido, onde tudo custa até 5 dólares, e marcas conhecidas convivem com marcas desconhecidas em itens que vão desde os de tecnologia até os de brinquedos infantis.
Ainda que o mercado americano pareça mais acessível à criação de “nichos”, no Brasil pode ser uma sugestão interessante para um tipo de varejo mais promocional porém não extremamente “popular”, ampliando o antigo modelo das redes de R$ 1,99 para uma experiência de compra com marcas mais relevantes e com amplitude de produto.
LEGO
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Além de ser fonte para brincadeiras e mesmo exercícios empresariais inspiradores, a Lego está dando ao mundo uma aula sobre desaprender. De acordo com a Forbes, a empresa Lego não terá mais peças plásticas até 2030. As peças serão substituídas por versões de polietileno, que tem como base a cana-de-açúcar. Determinante para a Lego, a mudança destaca a coragem de uma marca tradicional no mercado de mudar radicalmente seus processos, buscando renovação e longevidade. Mesmo que ainda não tenha garantias de que as peças terão a mesma qualidade ou possibilidade de utilização.
Agora, mais do que o investimento de quase US$ 200 milhões, imagine por um momento o impacto dessa mudança no cenário produtivo de uma empresa de mais de 80 anos que cresceu aprendendo a produzir à base de plástico. Imagine o impacto nas relações com fornecedores, acionistas, consumidores e mesmo turistas de parques temáticos com quase 100 milhões de peças que em breve se tornarão figuras de museu.
E reflita: se em meio a grandes redes e marcas dos EUA, uma empresa do tamanho da Lego está disposta a desaprender, por que nós, com processos supostamente menos arraigados, mais ágeis e de menor impacto ao redor, não estaríamos? Mais do que inspirar e educar, por exemplo, restaurantes que ainda usam canudo de plástico, a Lego nos ensina sobre a capacidade de nos reinventarmos por completo, antes que alguém o faça por nós.
Five Guys
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Assim como o exemplo da Chicken Salad Chick, esta rede também tem uma história de empreendedorismo que nos inspira pelo motivo que a fez começar: como forma de trazer os filhos para voltar a morar com ele depois da separação, um pai larga o emprego de planejador financeiro e monta uma lancheria onde os filhos possam trabalhar com ele. Acaba montando um hambúrguer caro demais e demorado para fazer, quando o McDonald’s vendia bem mais barato e entregava bem mais rápido. Como solução, colocou uma placa na porta da loja que dizia: “Se você está com pressa, existem ótimas hamburguerias aqui por perto”. Com isso, o Five Guys começou um nicho de Burger Premium que tinha as melhores batatas-fritas dos Estados Unidos.
No Brasil, já vemos redes de lojas gourmet se expandindo e gerando uma opção mais premium para os clientes. Como o Madero, que está no nicho casual dining e fast casual, que possui mais de 100 restaurantes no Brasil e já está nos Estados Unidos, e que se define como The World’s Best Burger (e que já vale R$ 3 bilhões).
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Um detalhe: quando você entra numa Five Guys, enxerga de cara umas caixas com amendoim na casca, convidando-o a se servir.
Method
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A Method é uma marca americana de produtos de limpeza que refez o conceito de “green doesn’t clean”.
Os jovens Adam Lowry e Eric Ryan construíram uma empresa de mais de US$ 100 milhões por acreditarem que havia uma definição errada para produtos de limpeza — que eram enquadrados em Low Interest Category. Segundo eles, não existia uma categoria de baixo interesse, e sim Low Interest Brands.
Com um design fora da curva (feito por Karim Rashid, um dos melhores do mundo) e uma batida de capitalismo consciente, a Method faz parte das grandes redes e marcas dos EUA e vem reinventando o segmento de limpeza no país.
Nos ensinando que existe, no Brasil, oportunidade para a criação de marcas de produtos de limpeza não voltadas apenas a preço (imagine, por exemplo, o impacto de produtos de limpeza com design para um restaurante com cozinha à vista).
Diane Von Fürstenberg/Rent The Runway
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Jenn Hyman, jovem fundadora da Rent the Runway, empresa de aluguel de roupas de alta costura (e que hoje se estende a outros nichos), teve uma visão: a de que, assim como com respeito a fotos e arquivos, o closet também se mudaria para a nuvem. Surpreendentemente ela consegue mostrar a ideia a Diane Von Fürstenberg (envia um email a ela), que chega a cancelar a reunião, mas a recebe quando ela invade o escritório da estilista.
Depois disso, ela vai ao presidente da grande rede de varejo americana Neiman Marcus pleiteando alugar um percentual de seu estoque, e se surpreende com a resposta dele: fique à vontade, nossas clientes já fazem isso em 70% das vezes — compram o vestido, escondem a etiqueta, usam e devolvem no outro dia.
O conceito chamou atenção dos sócios do Alibaba, e hoje a empresa tem valuation de quase US$1 bilhão. Um exemplo de como grandes marcas do setor de vestuário brasileiras poderiam dar chance a ideias de empreendedores como Jenn Hyman, e explorar um segmento que tende a crescer no mundo todo.
Após uma viagem em busca de insights e aprendizados, visitei grandes redes e marcas dos EUA, buscando conhecer um pouco mais sobre sua história e sobre seu modelo de negócios, capaz de conquistar e fidelizar milhares de clientes.